Nossa Árvore de Natal


Não sei por que insistimos nessa mania de importar modismos exóticos, tendo um folclore tão rico e um clima que em nada ajuda as tentativas de fingir flocos brancos, feitos com algodão, por cima de um suado pinheirinho. Por favor, não estou cometendo um sacrilégio, nem um ultraje as tradições natalinas, por isso não me condene ainda (apesar de merecer sentenças por tantas outras transgressões). Quando Jesus nasceu lá, em Belém, a mata rala era representada por oliveiras, figueiras e terebintos. Não existia nada que lembrasse, nem de longe, essas típicas árvores natalinas. Ninguém comeu peru nessa noite e tampouco cantaram jingle Bells. O cenário era singelo, a emoção era sincera e o momento foi sobrenatural e extraordinariamente milagroso ao ponto de receber, poucos dias depois, a visita de três reis magos.

A moda germânica do pinheiro de Natal foi introduzida, na América do Norte, pelos colonos alemães que chegaram à Pensilvânia e consideravam que uma planta sempre-verde era uma espécie de símbolo da imortalidade do Salvador. Bem, antes deles, os sacerdotes druidas faziam grinaldas de visco-branco (Viscum álbum) por causa das propriedades mágicas de suas folhas que não descoloriam nunca. Os nórdicos adoravam um freixo gigantesco e colossal que, na mitologia regional, era denominado de Yggdrasill e protegia os guerreiros vikings, mortos heroicamente em batalha, subindo a uma das partes mais altas da copa, a Vahala, para repousar eternamente; nas lendas nórdicas, dizia-se que as folhas, com seu eterno verdor, podiam trazer pessoas de volta a vida e apenas com um de seus frutos, qualquer doença seria curada.

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Árvore da Sabedoria

As árvores sempre fizeram parte da visão cosmogônica que alimenta as lendas e teorias, tentando explicar a origem do mundo; elas são arquétipos criando permanentemente imagens extraídas de um paraíso perdido. A Árvore da Sabedoria, no meio do Jardim do Éden, a Figueira que acolheu Buda, para alcançar o despertar espiritual; as macieiras do jardim das Hespérides que proporcionavam maçãs de ouro, fontes da juventude eterna; a Haoma, que Zaratustra se referia, como uma planta “Pai, Criador de tudo e de todos” no Império Persa. Enfim, símbolos sempre inspirados pela natureza.

Aí eu me pergunto: e as nossas árvores? Cadê a gameleira-branca, onde mora placidamente, Iroco, um orixá misterioso do candomblé, uma árvore sagrada que nunca deve ser cortada, pois sua seiva viraria sangue e o lenhador morreria. E as cajazeiras mal assombradas que mudam de lugar à meia-noite, segundo afirmara o escritor José Lins do Rêgo? E a jurema, de cujas raízes e galhos, transformados em pó, os babalorixás faziam uma bebida sagrada? Cadê a japecanga, usada como chibata pelo Caipora, nosso defensor das florestas? E a Ia-cí (mãe dos frutos), que governa a vida vegetal nas nossas matas?

Pois é, como dizia Menotti Del Picchia:

canafistula

 

“Cacique jequitibá

onde está tua tribo?

...onde estão tuas amantes gigantescas:

a caviúna de canitar altaneiro,

a paineira enflorada e redonda,

como as ancas de uma fêmea fecunda,

e as palmeiras esbeltas e adolescentes?

... foi o homem branco

de pele macia e de passos miúdos

quem apunhalou teus guerreiros?...”

 

 

Não pretendo voltar a nenhuma origem, não é esse o caso. Apenas sinto a vontade de mostrar meu verdadeiro “Eu” na Noite de Natal, ser o autor de mim mesmo, sem adereços complicados, nem esquemas rocambolescos. Quero olhar para o céu na tentativa de descobrir a famosa estrela que, segundo Mateus, anunciou o nascimento D’Ele e comer pão e beber vinho, no meu jardim sem pinheiros nem bolas vermelhas, mas, cheiroso de mirras e de incensos de olíbano verdadeiro. O ouro?... será das flores brilhantes, de minha canafístula!

incenso

Raul Cânovas

p a i s a g i s t a

 

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